Acendo o abajur – uma boneca rosa empoeirada que se perde em meio a livros, cadernos, remédios – e observo esse quarto que tão bem me representa. A bagunça das roupas, das apostilas reviradas, dos livros jogados, dos sapatos perdidos pelo chão é a representação da desordem da minha cabeça. A parede pintada numa cor viva, os móveis todos coloridos, os penduricalhos espalhados pelo quarto, os enfeites que enchem a escrivaninha, são detalhes coloridos que dão a esse lugar o mesmo ar de menininha que ainda carrego comigo.
Guardo aqui coisas sem as quais eu não viveria, mas o muito aqui existente já não preenche o vazio que trago no peito. Nem mesmo meu xodó, onde agora escrevo, com todos esses botões pesados, esse som encantador, nem mesmo ele é capaz de ocupar algum espaço desse buraco que a cada noite parece aumentar.
Esse que outrora fora meu refúgio, parece agora grande demais, vazio demais. Falta alguma coisa. Faz cada vez mais frio aqui dentro. A cama fica maior a cada noite. E eu fico cada vez menor. Corroída por esse espaço vazio que vai tomando conta de mim, aumentando junto com a cama, junto com o frio.
Ainda tento dormir. Fecho os olhos novamente, na tentativa de encontrar o sono, mas mergulho de novo num mundo de lembranças. E de desejos. Surge a vontade de alguém aqui comigo. Todo para mim. Só meu. Uma companhia que torne a cama menor, o quarto mais quente, o vazio menos vazio.
Preciso dormir. Apago a luz do abajur e mergulho na escuridão do quarto, acreditando ser capaz de esquecer tudo isso e adormecer. Os olhos mais uma vez fechados e, ao invés de uma nova viagem, a chegada de todas as outras. Uma explicação para a insônia, um motivo para os devaneios: não quero apenas uma companhia, quero aquela companhia.