segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Ainda assim...

Era um dia como outro qualquer. Na verdade, deveria ser, mas para ele não era. Tinha conversado com ela por horas até que conseguiu convencê-la a encontrar-se com ele no dia seguinte. E o dia seguinte era hoje.
Levantou da cama com a ideia de que a veria, mas tinha que se controlar, porque algo poderia acontecer e os planos poderiam mudar. Ela sempre fazia dessas. E ele sempre ficava esperando, por mais que ela não o pedisse. Então ele se arrumou como se fosse encontrá-la naquele momento. Pensou em tudo o que faria antes de vê-la. Esquematizou em sua cabeça como faria tudo o que tinha para fazer antes de ter a companhia dela de novo. Depois de tudo pronto, saiu.
O dia passou, veio a confirmação do encontro. E trouxe junto aquele nervosismo que há tempos não sentia. A hora passou mais devagar e as coisas perderam um pouco da cor. Mas ele suportou, decidido a não mais sentir nada disso.
Saindo do trabalho, pegou um ônibus e tentou ler qualquer coisa durante o trajeto, que, por mais curto que fosse, seria quase torturante com aquele frio na barriga. Mas quando desceu do ônibus, não pôde mais ocupar a cabeça, nem mesmo com a música que tocava nos fones em seus ouvidos e o isolava do resto do mundo. Aquela ansiedade que tanto sentia tempos atrás havia voltado, e não podia controlá-la. Caminhava devagar, respirava fundo, tentava acalmar-se. Conseguiu. Um pouco, pelo menos.
Quando chegou à lanchonete, ela estava sentada numa mesa com alguns amigos, uns já conhecidos dele, outros novos. Cumprimentou-a com um abraço apertado, daqueles que ele tanto gostava, daqueles que aumentavam seu nervosismo. Cumprimentou a todos com um aperto de mão e sentou-se. Ali estavam eles novamente, e era como se as outras pessoas não estivessem ali. Ele olhava para aquele rosto tão familiar, aquela boca que tanto lhe convidava a loucuras. E o tempo passava tão rápido, mas ele nem via, perdendo-se em toda aquela conversa que só fazia sentido porque podia ouvir a voz dela de novo.
Finalmente, teve a oportunidade que tanto queria: os amigos dela foram embora, deixando os dois sozinhos em meio àquela multidão que tornava a lanchonete tão barulhenta. E eles conversaram, riram, ficaram sérios, falaram de como era antes, de como era com eles. E ele disfarçava seus pensamentos com sorrisos, concordando cada vez que ela dizia que tinha valido a pena. Por mais que, em algum canto de seu ser, ele quisesse abraçá-la e dizer que não queria mais ficar longe, ele sorria. Ainda que tivesse conseguido esconder tão bem dos outros, até de si mesmo, e por tanto tempo aquele sentimento, alguma coisa fez que tudo fosse revelado, mas só para ele. Tudo aquilo de que tentara livrar-se há algum tempo, e que acreditava ter conseguido, voltava a atormentá-lo e encantá-lo.
Ela então se deu conta de como estava tarde e de que precisava ir embora. Ele, como sempre, disse que tudo bem. Ele a acompanhou até seu carro, despediu-se dela com mais um abraço aconchegante e a viu partir. Ele seguiu seu caminho a pé, pensando em como era linda, encantadora, e em como ela destinava a outro as delícias de ser seu namorado.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Mais um conto de desilusão

Passava horas lendo contos sobre o amor. Gastava seu tempo imaginando aqueles personagens. Ganhava tempo se imaginando como aqueles personagens. Sonhava com aqueles homens dos contos que lia, que ao invés de reis de contos de fada eram seres comuns, que a admiravam enquanto dormia. Ao invés de cavalos brancos, os homens que imaginava a encontravam a pé para uma caminhada num parque ao anoitecer. Ao invés dos castelos, seus sonhos se passavam em apartamentos aconchegantes, pequenos e só deles, onde podiam passear de moletom surrado e pés descalços. Encantava-se ao imaginar os bilhetinhos espalhados pela casa, cada um com uma declaração simples do amor que aquele homem dos sonhos sentia por ela. Fascinavam-lhe os elogios matinais, quando ainda estava descabelada e sonolenta. Imaginava as tardes de domingo regadas a vinho e ao som de vinis de Elis e Chico, as noites de bons filmes e ruídos casuais. Sonhava com o amor grande e simples, com a entrega, com os gestos (mais que com as palavras), com os momentos (mais que com as promessas). Podiam parecer sonhos pequenos, mas gostava deles por parecerem tão possíveis.